Blockchain precisa de regulamentação

O Brasil teria mais chance de obter ganhos na economia caso ampliasse o uso do blockchain, um sistema de registro de informações que permite gravar e rastrear uma operação feita em formato digital. Há iniciativas isoladas no país – como a desenvolvida pelo Banco Central, pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que permite trocar informações em tempo real. Mas para que a tecnologia avance pelo país com segurança é preciso regulamentação, dizem especialistas. “O blockchain tem caráter fundamental”, disse a especialista no assunto da Universidade de Oxford, Tatiana Trícia de Paiva Revoredo. “Ele é comparado com a energia elétrica, com a automação e com a indústria do aço. São tecnologias e inovações que provocaram impactos em todas as indústrias e nos relacionamentos entre as pessoas”, disse.

Rodrigo Caldas de Carvalho Borges, sócio do Lucas de Lima e Medeiros Advogados, disse que “no Brasil, nós temos muitos projetos e pouca coisa implementada”. Além do registro dos dados, que permite rastreamento, o blockchain garante que a transação não será apagada do sistema e os dados não ficam arquivados em apenas um lugar, mas em vários. Borges mencionou que alguns bancos no Brasil, como o Santander, já estão usando essa tecnologia para remessas de dinheiro. Mas falta regulamentação para avançar. “Hoje, nós carecemos de um cenário regulatório favorável às novas tecnologias. Com isso, vemos aplicações superinteressantes sendo implementadas no exterior. Ainda não há a segurança necessária no Brasil”, disse ele.

Tatiana, que participou recentemente de um encontro organizado pelo Parlamento Europeu para discutir o assunto, disse que a China está interessada em educar a população para aprimorar o blockchain e já determinou que autoridades busquem novos usos para essa tecnologia. Borges disse que “o Brasil está à margem disso, pois não se tem a posição do governo de se fazer isso no país. É preciso saber se o governo vai autorizar”. No Congresso Nacional, o Projeto de Lei nº 2.303, de 2015, trata de blockchain, mais especificamente da inclusão das moedas virtuais e programas de milhagem aéreas na definição de “arranjos de pagamento” sob a supervisão do Banco Central. Tatiana chegou a participar de uma audiência pública organizada pela Comissão de Tecnologia da Câmara, mas o projeto não avançou. Borges disse que o projeto “está parado em função do ano eleitoral.”

Uma iniciativa interessante foi anunciada há seis semanas. O Banco Central, a Susep e a CVM informaram que haviam se unido para desenvolver um projeto baseado em blockchain. O objetivo é deixar mais rápido o intercâmbio de informações e a tomada de decisões entre essas instituições. Feito com recursos da plataforma de computação em nuvem da Microsoft, as instituições trocam informações em tempo real. O projeto começou a ser implementado em abril. O projeto é baseado no Quorum, uma versão corporativa do Ethereum, desenvolvida pelo J.P. Morgan e que se tornou um dos protocolos de blockchain mais populares do mundo. O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, consultado pelo Valor, reconhece os potenciais do blockchain e se posiciona a favor de seu desenvolvimento no país. Em nota, informou que Rússia, Estônia, Georgia, Reino Unido e Dubai têm se destacado na adoção e regulação desse sistema. Serviços como os de registro de cidadãos, de previdência e cartoriais já contam, em alguns países, com operações em blockchain.

No Brasil, disse Tatiana, seria necessário reduzir barreiras às empresas que quisessem operar com blockchain. Ela defende a redução de impostos para esse tipo de operação. “O ponto fundamental é que não é uma simples tecnologia, como a [que permitiu o surgimento da] televisão. Essa tecnologia tem o potencial de transformar a relação entre as pessoas e o modo como os cidadãos se relacionam com os governos”, disse a especialista de Oxford.

Fonte: Valor Econômico